Após 28 dias de missão na BR-364, bombeiro conta como foi experiência

Bombeiros ajudavam caminhoneiros na travessia em trecho inundado da BR-364
(Foto: Victor Flores/Arquivo Pessoal)
Há menos de um ano atuando no Corpo de Bombeiros, o soldado Victor Flores, de 21 anos, acabou de passar por uma missão que ficará para sempre em sua memória. Ele retornou no último dia (15) para o Acre, após passar 28 dias ajudando caminhoneiros a passarem pelos trechos críticos da BR-364, que ficou inundada devida à cheia história do Rio Madeira, em Rondônia. O soldado relembra dos principais momentos que toda a equipe classifica como 'operação de guerra'.

"Aquilo foi uma operação de guerra. Ter todo um estado dependendo da gente para ser abastecido é uma responsabilidade muito grande. No começo, conseguíamos passar cinco caminhões e ficávamos felizes. No final, já estávamos conseguindo passar até 70 caminhões em um dia", lembra.

Victor era um dos acreanos que fazia parte da 'Operação Travessia', composta por representantes do Corpo de Bombeiros, Defesa Civil e Departamento de Estradas e Rodagens (Deracre). Três equipes atuavam em diferentes partes de Rondônia (aeroporto de Porto Velho, Jacy-Paraná e Nova Mutum) para garantir o abastecimento do Acre. O soldado estava em um dos pontos mais críticos, Nova Mutum, e era responsável por auxiliar a travessia dos caminhoneiros no trecho.

"Nós auxiliávamos, balizávamos a estrada, mostrávamos onde tinha buraco, muitas vezes, íamos dentro da cabine com os motoristas. No começo, não tínhamos nenhuma máquina para auxiliar, apenas umas pranchas em que passavam os caminhões. Como a água ainda não estava em um nível tão alto, não havia a necessidade dos equipamentos, mas muitos caminhões quebravam no percurso", conta.

Quando o caminhão quebrava era necessário mergulhar nas águas do Rio Madeira e consertar o veículo de baixo da água. "O caminhão não conseguia passar e quebrava, e aí os freios travavam. Nós mergulhávamos, passávamos 20 minutos na água. O caminhoneiro falava qual era o parafuso e nós dávamos um jeito de achar, afrouxar. Isso com a carreta em cima da gente. No começo, os mergulhos não ocorriam com muita frequência, porque até então os caminhões viam sozinhos", lembra o soldado.

Para Victor, cada travessia era muito emocionante e muitos caminhoneiros chegavam a chorar. "A parte mais honrosa da missão era quando a gente conseguia passar os caminhões, nós víamos a felicidade dos caminhoneiros, porque a carga até então, era de responsabilidade deles", fala.

Mineirinho
Entre os dias em que esteve na operação, uma história se destaca na memória do soldado que foi quando a equipe salvou a vida de um caminhoneiro. Victor não sabe o nome do homem que ficou em perigo, recorda apenas do apelido, 'Mineirinho'. Ele lembra que o caminhoneiro insistiu para passar no trecho, mas a descarga do caminhão entupiu com a água.

"O monóxido de carbono começou a sair na cabine. Era um caminhão velho, e nós avisamos para ele que não era uma boa ideia. Ele colocou a cabeça para fora, pela janela, e disse que ia continuar. A cabine já esta escura de fumaça, então, ele sumiu na cabine", recorda.

A equipe foi de barco até o caminhão e entrou na cabine, foi quando encontraram o 'Mineirinho'. "Ele estava se tremendo, segurado no volante, em estado de choque. Não respondia, não fazia nada. Nós levamos ele para Jacy-Paraná, teve três convulsões, uma parada respiratória. Ficou uns dias mal, depois foi no trecho em que estávamos e agradeceu por salvarmos a vida dele", recorda.

Para Victor, a gratidão e a sensação de um dever cumprido foram as melhores recompensas que a operação pode oferecer.

'Tínhamos que rever diariamente nossas estratégias', diz tenente
Mesmo com a maior parte dos representantes acreanos retornando para casa, a 'Operação Travessia' continua em Rôndonia até este sábado (19). O representante da Defesa Civil na operação, tenente-coronel do Corpo de Bombeiros Carlos Batista, de 43 anos, passou 56 dias na operação. Há 24 anos atuando no Corpo de Bombeiros, ele conta que nunca passou por uma operação desta complexidade.

"Cada dia o cenário se apresentava de forma diferente, fazia o planejamento um dia, mas o cenário mudava e tínhamos que rever diariamente todas as nossas estratégias", recorda.

Para ele, o estresse e a ansiedade dos caminhoneiros poderia ter dificultado a operação, mas foi possível transformar os responsáveis pelas cargas em aliados. "A ansiedade, muitas vezes os ânimos a flor da pele, e o isolamento dos caminhoneiros formava os ingredientes para um ambiente de conflito. Mas conseguimos fazer com que os caminhoneiros se tornassem nossos aliados, de forma que gastássemos nossas energias não com problemas, mas na busca de soluções para travessia de alimentos para o Acre", afirma.

Ao todo, ele acredita que mais de 120 pessoas participaram de forma direta da operação. "Era uma parceria com a Polícia Rodoviária Federal [PRF-AC], Depasa [Departamento Estadual de Pavimentação e Saneamento do Acre]. Tinham mais de 60 pessoas do Acre em Rondônia. Cerca de 41 bombeiros envolvidos diretamente da operação", finaliza.

Veriana Ribeiro
Do G1 AC

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